Gervásio disse a Mariinha que ficasse só na varanda. Parece, até, que não conhece criança. Foi virar as costas e a menina já estava no quintal. Catando pitomba. Correndo. Atirando pedras nos passarinhos.
Mariinha é menina levada. Só tem irmãos. Nunca brincou de boneca. Gervásio preocupa-se mais com os vizinhos do que com a própria filha.
- O que vão pensar de você, Mariinha?
- Por que alguém tem que pensar em mim?
- Menina, se continuar assim, quando crescer não casa.
- Blergh!
E saía correndo. Mariinha não quer casar. Mulheres morrem quando casam, pensava. Casamento só faz chorar. Vovó casou e morreu, mamãe também. Eu não vou morrer. Não caso, não caso, não caso!
- E vai fazer o quê, Mariinha?
- Conhecer o mundo, aprender a falar com essa gente que tem um dizer estranho, ir nos lugares que aparecem na televisão. Estudar, trabalhar, ter dinheiro. Vou ser grande, oras! Não é isso que gente grande faz? Sai por aí sem avisar?
Gervásio nunca se deu o trabalho de explicar direito. Casar é bom, um dia você vai querer. As mulheres nascem e crescem pra isso. É pra casar e ter filhos que as pessoas estão no mundo.
- E a minha mãe?
Virou estrelinha, ele respondia e se calava.
Mariinha, feliz com suas pitombas, brincava no quintal. Foi nesse dia em que Zeca chegou. Menino franzino, desconfiado, viu as pitombas, olhou pra Mariinha e parou. Ficou ali, estático. Mariinha logo ofereceu-lhe a fruta.
- Você quer? Não é muito gostosa, mas agora só tem essa.
- O que é isso?
- Pitomba.
- É de comer?
Mariinha achou esquisito alguém que não conhecesse a fruta. Nem respondeu. Comeu. Olhou de novo o menino e estendeu o cacho. Ele repetiu os gestos dela. Achou o gosto horrível, mas não quis parecer estranho. Comeu também.
Zeca era recém-chegado na vizinhança. Vinha da cidade. Morava só com a mãe. O pai havia falecido há pouco.
Passaram toda a tarde no quintal. Mariinha mostrou o balanço de pneu. Foi até o córrego. Inventaram brincadeiras com ferramentas, caixas e latas abandonadas.
Não muito antes de Gervásio retornar, Mariinha, exausta, despediu-se de Zeca. Marcaram um novo encontro na tarde seguinte.
- ... assim que meu pai sair.
- Pode deixar!
Correu para fazer a lição de casa e tomar banho. Recebeu o pai na porta com os olhos brilhando.
- Pai, quando eu posso casar?
- Quando crescer, Mariinha.
- Mas, pai...
- O que é, menina?
- Quando é que eu vou crescer?
- Quando crescer, Mariinha. Por quê?
- É que o Zeca...
- Que Zeca?
- O Zeca é o meu amigo, pai. Ele mudou pra cá. A gente comeu pitomba. Ele gosta de brincar no quintal. Gosta de correr, de pular corda, nadar no córrego. Ele vem amanhã de novo. Amanhã eu já cresci, pai?
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