terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Clarice ou Cecília?


Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!
(Cecília Meireles - Isto ou aquilo)

Isto ou aquilo. Sempre. Mundo de escolhas. Eu não escolho. A escolha é da Sofia. Eu e os outros. Nunca. Escolhas. Isto ou aquilo.

Escolho Clarice: E tinha agora a responsabilidade de ser ela mesma. Nesse mundo de escolhas, ela parecia ter escolhido.

Eu ou os outros.
Sempre.

O som do tambor

O sino tocou.

Acordei cansada de esperar aquilo que nunca chega. 

Acendi incensos pra Buda no Templo do Lama. Ele disse que as respostas estão em mim. Pedi um GPS pra encontrá-las. Não sei usar mapas.

Buda riu. Orientou-me a ficar em silêncio.

Ouvi o som do tambor.

Perguntinha

Eu vou pra Itália e você questiona.
Eu vou pro Caribe e você tem inveja.
Eu vou pra NY e você detona.
Eu vou pro Mardi Gras e você condena.
Eu vou pra Malta e você duvida.
Eu vou pra China e você critica.

E você que não vai pra lugar algum, por que não vai pro inferno?

domingo, 21 de fevereiro de 2016

Amanhã...

07h00m. Despertador. Mamadeira. Vó. Uniforme. Levanto resmungando e faço “o de sempre”. Hoje não vou perder o ônibus, penso. Menos uma bronca. Chego na escola com sono. Não devia ter assistido filmes até tarde. Tarde. Agora é tarde, penso.

Os coleguinhas querem brincar, querem meu lanche, querem conversar. Eu só quero dormir. Dormir e esquecer. Esquecer que tenho de levantar cedo todos os dias.

Dezoito anos na mesma empresa, no mesmo cargo,  as mesmas pessoas. Sempre mais do mesmo. Vida monótona. Aliás, era monótona,  até que ele chegou. Parecia amigo, interessado, inteligente. Parecia...

Ninguém engana muita gente por muito tempo, alguém disse.

Ele é mais novo, cronologicamente, mas tem comportamento de velho. Ranzinza. Chato mesmo! Às vezes, não. Puxa meu cabelo e rouba meus doces. Volto pra casa chorando. Sempre. Vovó quer saber porquê. Não conto. Tenho vergonha.

Vergonha de dizer que ele está errado. E me calo. Ele que deveria se sentir mal por falar tantas asneiras. Mas ninguém se arrisca a dizer nada. Ele abre a boca e tos outros abaixam a cabeça. Tenta se impor. Apenas se expõe.

A bola é dele e, se ele não escolhe o jogo, ninguém brinca.

Nem sempre gosto do jogo. Tento não me importar com isso. Resisto às provocações. Sou a última a ser escolhida. Queimo todos. Devolvo a bola com um sorriso maroto. Campeã. Ganho o direito de escolher o meu time na partida seguinte. Ele emburra. Diz que tem de voltar pra casa. Leva a bola.

Minha casa é meu santuário. Entram pessoas que contribuem. Comida, bebida e alma. Esse é o ingresso. A maioria não tem. Gente perde a alma quando cresce, penso.

- Eu nunca vou crescer! Ele gritou. Os pais dele se separaram. Quis consolar e o abracei. Os meninos o viram chorando. Chamaram de mulherzinha. Ele brigou comigo.

Disse-me que era gay e, por isso, tinha muito a provar. Provar da vida, indaguei. Não, a si mesmo, respondeu. Foi o único contato mais próximo. Estava bêbado. Negou depois. Fingi que não lembrava. Melhor assim.

23h00. Filmes novamente.
Preciso dormir.
Amanhã tenho de...