segunda-feira, 26 de março de 2012

Descoberta

Amanhã eu faço isso é o meu lema!

A dança

É mais ou menos assim: dois pra lá, dois pra cá. A gente segue o ritmo da música. Pisa no meu pé, eu não ligo. Te levo. Esse cheiro... Ah, esse cheiro de shampoo. Sabonete. Não sei. Pele macia. Voz mansa. Dois pra lá. Corpo grudado. Quente. Seus lábios roçando meu pescoço. Um arrepio. Dois pra cá.

E eu rezando baixinho pra música não acabar.

The dream is over

A sereia partiu. A água secou. O grande rabo transformou-se em duas pernas. Nem bonitas, nem feias. Finas. Não nada mais. Nem canta. Vestiu terninho. Foi trabalhar.

Enquadrou-se, dizem por aí.

terça-feira, 20 de março de 2012

Sábia

A arte de sorrir cada vez que o mundo diz não

Um canto de adeus

O que (se) foi é (s)ido, disse Arnaldo Antunes. E não há sofrimento maior no mundo do que esse causado por um adeus. O adeus da morte. Da saúde. Da juventude. De um amor. O adeus que se dá às ilusões quando se descobre estar vivendo uma mentira.

Adeus estraçalha a gente. Palavra simples. Interjeição. Substantivo masculino. Duas sílabas. Imenso poder de destruição. Saber que o que se foi não volta mais.

Adeus dilacera a alma. Adeus é morte em vida!

A pele que perde o viço. As gengivas que encolhem e expõem as raízes dos dentes. A dificuldade em executar tarefas antes tão corriqueiras. Não me reconhecer no espelho. O tempo que leva silenciosamente minha juventude. Inexorável. Aliado do adeus.

Adeus trágico que marca a proximidade do fim quando só me restam pústulas, caroços e toda sorte de anomalias com nomes estranhíssimos que sequer me arrisco a pronunciar.

A lágrima que insiste em brotar nesses olhos já cansados de tanto chorar. A saudade que imprime um sinal indelével em quem ficou. Adeus definitivo e maldito que me separa no tempo e espaço de alguém querido.

Adeus doloroso que revela, sem piedade, aquilo que me recuso a entender. Adeus irremediável que traduz de forma perfeita toda e qualquer frase iniciada com “Nunca mais”.

Nunca mais o cheiro. Nunca mais o abraço. Nunca mais o riso. Nunca. Nunca. Nunca mais… Nada!

Adeus cruel que leva o amor e ressuscita a solidão. Mata as faceiras ilusões de felicidade sem fim. Aniquila a inocência. Dá vazão ao sombrio. Igual a morte, anda lado a lado ao nunca mais. Nunca mais doído que poderia não existir.

Adeus incerto que me separa para sempre do ser almejado, sem que para sempre ele tenha partido. Adeus que não deveria existir. Que, quisera eu, fosse sublimado. Adeus ardiloso que vem e, na minha história, coloca um ponto final.

Ideia

Recebi um e-mail com a programação de um hotel de selva. Uma semana na Amazônia, pensei, é uma boa ideia pra fugir da fase arrumação-pós-obra.

- Feriado, meu bem, cadê você?

Mudanças

Depois de muito reclamar, começo a voltar para casa. Semi-limpa, reformada e ainda bagunçada. Não tem cara de casa, mas de obra. Falta o meu jeito, meu cheiro, minha impressão. É a segunda parte do trabalho.

Não gosto de mudanças, descobri. Tive febre. Emocional, disse a terapeuta. Tive de concordar. Já foram duas malas pequenas. Trouxe a grande com o objetivo de cortar o cordão umbilical (formado em tão pouco tempo) de vez. Estou cansada, disse para me enganar, faço amanhã.

Bohemia e conversas amenas. Nao volto hoje. Botei a culpa na terapeuta. Amigo G. disse que vai me exportar pra casa dela. Tive de rir.

Saudades antecipadas de tudo. A matrona que cuida também (ou tão bem) de mim, conversas sempres estranhas no café-da-manhã, tentativas vãs de ludibriar G. e engordar a cachorra, catar frutas no quintal, tostar no sol, fingir arrumar o quarto depois de ser chamada de "A mais preguiçosa das mortais".

Vou voltar pra casa. Voltarei aos poucos. No meu tempo. Na minha velocidade.

Mais lenta do que Dorival Caymmi.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Mais do mesmo ou O pedreiro e o gato (parte II)

- Dona Carolina, o gato não tá aqui! Eu cheguei cedo e não ouvi nada, estranhei porque ele começa a miar logo que eu entro na portaria. Comecei a trabalhar no banheiro da sua vizinha e nada de barulho. Aí resolvi olhar seu apartamento e ele não está aqui. Dona Carolina, o gato sumiu!!!
- Calma... Deixei o gato no veterinário. Amanhã ele volta.
- Ai meu Deus, quase morri de susto! A senhora não faz mais isso não, viu?

(...)

- Alô?
- Alô.
- É a Carolina, tudo bem?
- Tudo. A senhora está precisando de alguma coisa?
- Não, não. É só pra avisar que o gato já está em casa.
- Ah, tá. Daqui a pouco eu vou lá ver como ele tá.

segunda-feira, 12 de março de 2012

O pedreiro e o gato

- Dona Carolina, aconteceu uma coisa horrível!
- Você matou o gato?
- Não, não foi isso. É que...
- O gato fugiu?
- Não, dona Carolina, o gato tá bem.
- Então o que aconteceu de tão horrível?
- É que eu vou ser preso por causa de pensão alimentícia...

- Ah, é isso? Achei que era coisa séria!!!

sábado, 10 de março de 2012

Prefácio de mim mesma

Como se a vida fosse livro, escrevo esse prefácio. Escrevo-o, eu mesma, porque não há quem convidar. Afinal, quem escreve prefácio de autores desconhecidos? Os amigos do ilustre desconhecido, alguém dirá.

Prefiro, eu mesma, escrever então. O que os amigos podem dizer é incerto. Tomo para mim a árdua tarefa. Não por preciosismo. Ou por arrogância. Não sou Narciso.

A verdade é que faço-o por medo. Sem poder editar, nortear, determinar, cercear, como aceitar - resignada - o que dirão? Pior ainda, como recusar tais linhas, se de forma alguma me agradarem? E se a vida a ser prefaciada é a minha, como não exigir que tal prefácio me agrade?

(Bah.. dei tanta volta... Caprichei tanto na explicação do prefácio que até esqueci o que ia dizer!)

Filme da Vida

Ando assim, nem lá nem cá. Enfadada e também enfadonha. Nada fada. As asinhas não andam batendo muito. Não é ruim. Nem bom.

Parece aquele momento em que você para de viver a vida e só observa. É. O filme da vida. Francês. Sem ação. Não, filme francês tem muito diálogo.

É um filme mudo, lento, com belas paisagens. Isso! Primavera, verão, outono, inverno... e primavera. Kim Ki-duk.

A única diferença é que a trilha sonora foi composta pelo Fagner e tem apenas uma música!

Convivência

Escuto Fagner no último volume do radinho. Repito a música dez vezes. Ele franze o cenho. Ainda estamos no café da manhã. Ele proíbe a música por uma semana. Como as pinhas dele enquanto ele rouba minhas torradas.

- Eu vou embora essa semana...
- Promete?
- Você vai sentir minha falta.
- Ah, claro!

Não se aguenta. Ri das minhas ideias de decoração. Canto alto. Ele dá gargalhadas. Diz que sou desafinada. Implica, implica e implica. Mas se faço charminho, vem correndo saber o que é.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Hermético

Eu te avisei! Meu bem, eu te avisei...

Chora, me liga, implora
Meu beijo de novo
Me pede socorro
Quem sabe eu vou te salvar

Chora, me liga, implora
Pelo meu amor
Pede por favor
Quem sabe um dia eu volto a te procurar

(Chora, Me liga - João Bosco e Vinícius)

domingo, 4 de março de 2012

Love don't live here anymore

... e tenho sérias dúvidas se um dia, realmente, morou aqui. Mas vá lá, a melodia é bonita. A letra nem tanto, tristíssima. Coisa de fundo do poço, dor de cotovelo, melodrama.

Não tenho muita paciência. Nem pra sofrer. Sofrimento cansa. Extenua. E, no fim, não parece muito sincero.
Eu sofro de vergonha alheia...

sexta-feira, 2 de março de 2012

Definições

Cópia
s.f. Reprodução manual ou automática de um texto, documento etc.
Imitação exata de uma obra de arte: cópia de um quadro.
Imitação desonesta de uma obra; plágio:

Diário
s.m. Livro de anotações contendo a narrativa diária de experiências pessoais. Na literatura inglesa, encontra-se grande número de diários importantes.

Gerúndio
s.m. Forma nominal e invariável dos verbos, proveniente do ablativo do gerúndio latino, e caracterizada, em português, pela desinência -ndo: copiando, refazendo, reproduzindo, pondo.

diário-gerúndio*
pensando em hades & tártaro. sobrevivendo ao caos. arrastando os pertences dentro do saco de pim. agarrando o saco. lutando com unhas e dentes. sabendo como é.

vivendo na ilha da fantasia. usurpando mimos do verdadeiro rei. engordando o cão. ludibriando o rei. simulando contrição. ouvindo ultrajes. respirando fundo. retrucando insultos. semeando a discórdia.

disfarçando indecências. escondendo carências. dissimulando intenções. resvalando para a concupiscência. desviando o olhar dos olhos inquisidores da matrona. criando subterfúgios & submergindo. querendo o nada de atreyu.

adquirindo micróbios, germes e doenças na rede de alcance mundial.

sonhando & ansiando & vivendo & respirando & pensando 24×7 no mausoléu & na obra & na arte. procrastinando as famigeradas promessas de fim de ano. fumando.

sendo sereia em terra firme.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Dormi em um pote de limão, só pode... Acordei mais azeda do que de costume. Foi uma luta pra levantar da cama. O cachorro latiu a noite inteira para uma árvore.

- O QUE É? TÁ VENDO ESPÍRITOS AGORA?

Quando me dei conta já tinha gritado. O vizinho acedeu a luz da janela e eu voltei correndo pro quarto. Três horas da manhã não é uma boa hora pra discutir com os outros no quintal. Deve ter sido isso que estragou minha noite. Isso ou o sonho estranho. Pesadelo, define melhor. Sangue, vísceras, assalto, perseguição, sirene e, é claro, um cachorro latindo.

Banho rápido, roupa passada. Peguei o carro e saí. Na esquina lembrei da água do café. Voltei, desliguei o fogo e conferi as janelas. O que começa errado não termina certo, dizia minha avó. Parece que o tamanho da pressa é diretamente proporcional à quantidade de coisas que podem dar errado.

Não peguei trânsito, o que foi uma surpresa e, no fim, consegui chegar à tempo no trabalho. Aliás, adiantada. A portaria estava fechada. Toquei o interfone do prédio. Nada. Mais uma vez. E outra. Na terceira, Dona Cândida apareceu pra abrir. Vinha lá do fundo com uma cara espantada.

- Bom dia Dona Renata... Muito trabalho?
- O tanto de sempre, Dona Cândida.
- Ah... mas precisa vir aos domingos também?
- O quê???

É vó... O que começa errado não termina certo. Definitivamente!