quarta-feira, 19 de junho de 2013

... e hoje é o Dia Internacional do Pronto Falei Tirei um Peso das Minhas Costas!

Para onde foram as boas ideias?

Desisti, enfim. Como desisto todos os dias e também diariamente recomeço.

Drosophila Melanogaster, a antiga mosca da fruta. Foi isso que apareceu. Ah! Junto com uma tremenda dor de cabeça, é claro. Duzentos cigarros. Água, muita água. Diversas vezes interrompida pela mosca mental.

Por que, Deus, eu não consigo ter uma ideiazinha sequer? Fecho os olhos, respiro fundo, vejo uma tela negra com letras garrafais brancas. Não está nítido. Permaneço assim por um tempo. Concentro-me em decifrar a mensagem. Drosophila Melanogaster, é o que está escrito.

Nova pausa. Volta olímpica pela casa.

Imagino, então, merecer a medalha da corrida quarto-cozinha-com-obstáculos. O isqueiro sumiu. Acendo os cigarros e queimo os cílios no fogão enquanto perscruto o ambiente em busca de inspiração.

Manual técnico de tortura para principiantes: Capítulo 63 - Como obter a verdade e nada mais que a verdade de um escritor?
1. Faça-o pensar que tudo já foi escrito, lido, representado, feito, mostrado, visto, aplaudido.
2. Quando ele entender que não há nada novo a ser dito, coloque-o sentado em frente a um computador, com as mãos livres e peça um texto.
3. Tela branca, cursor piscando, piscando, piscando...
4. Acrescente crueldade e diga que o tema é livre.

Outro cigarro. Achei o isqueiro. Ahá! Uma fagulha de sorte... o jogo vai virar.

MmMmMMHoHAOahoAHahahahHAHAHaH (onomatopeia ridícula para risada maligna)

Ou não. Estava vazio.

Quem dizia Oh vida, oh azar? nos desenhos animados? Estou com essa sensação como coisa real por dentro e plagiando Pessoa descaradamente como coisa real por fora. Dentro do carro havia um isqueiro, havia um isqueiro dentro do carro. Imitação chinfrim daqueles que admiro.

Ao menos a Srta. Melanogaster se foi. Dizem, os entendidos de insetos, que a vida delas tem duração curta. Assim, penso que Drosó morreu. E não vai receber honras fúnebres, nem mesmo mentais.

Que fixação dos diabos em insetos! Para onde foram as personagens e suas histórias?

Era uma vez...

Era uma vez um escritor que queria-porque-queria começar um texto com era uma vez. Eu também queria. Mas não consigo. E termino por aqui, afirmando que foram felizes para sempre!
Sobre todos aqueles que ainda continuam tentando, Deus, derrama teu Sol mais luminoso.
(Caio F.)

Eu, o porco e a expectativa...

Recuso-me a acreditar que não vou aprender isso nunca. Mais uma vez a vida me mostra que devo criar porcos e contentar-me com o bacon. Mais uma vez, fiz planos, criei expectativas e fiquei com fome.

Minha incapacidade de ler sinais passa dos limites. Pode-se, inclusive, dizer que é patética. Patética, também, é a mania de fazer tempestade em copo d’água. Patética é a autocensura. Tudo é patético.

A questão, que às vezes é ínfima, toma uma proporção descomunal. A coisa desanda num efeito dominó. Por quê? Porque não falo, sou dada a grandes dramas e não gosto muito de ser contrariada. Ok, Mea Culpa.

Mas, além disso, acho que hoje em dia as pessoas não veem mais importância em respeitar os outros, honrar o que dizem e muito menos em ouvir, conhecer, entender alguém de verdade. Culpa alheia.

Tudo é coisa que dá e passa, eu sei. Mas tem uns lances que não precisavam dar, sabe? Mágoa está nessa categoria. Envenena, entristece e ainda custa a passar.


Os sapatinhos no armário, bem lá no fundo. Aqueles mesmos de quando cheguei. Calcei hoje. Pensei que não serviriam. Que bobagem, não? Pés não crescem mais depois de uma certa idade.

Enchi a mala com tudo que tinha. Roupas, objetos pessoais, fotos, uns utensílios de cozinha e até um pouco de comida. Só ficou de fora a dignidade, porque perdi há tempos.

Peguei meus pertences, meu olho roxo, minha desilusão e parti.

Dessa vez, para sempre.

terça-feira, 11 de junho de 2013

Das relações

A gente tem essa relação bolha de sabão. Linda, leve e frágil. Sustenta-se no ar por um tempo, mas tem rompimento predito.

Brilhe e vá pra bem longe de mim bolhinha, que já estou farta de fracassos. Suba e suma. Infernize a vida de outrem com sua beleza delicada e quebradiça, flutuando sem rumo.

Construímos castelo de areia na beira do mar. Bem sabemos que será levado pelas ondas. Ainda assim, insistimos. A água apagará o fogo.

Deixe-me só, que dos meus restos sei cuidar. Parta logo. Feche a porta. Apague as luzes.

Cronos se encarregará de extinguir seus vestígios.

Sem novidades no front

Às vezes acordo cinza. Triste. Vazia. Fria. Não há sol no universo capaz de me aquecer. É a falta de algo que nem sei o que é. Saio pelas ruas e nada me satisfaz.

Parece que tudo já foi feito, visto, escrito, falado. Vivo a cópia da cópia da cópia.

Sem novidades. Cem esperanças mortas.

O livro da vida não tem páginas em branco. Repetição exaustiva.

Não penso, nem existo.




Eu tive um sonho ruim...

 e acordei chorando.
 Por isso eu te liguei.
 Será que você ainda pensa em mim?
 Será que você ainda pensa?


Na terra do coração

Caio Fernando Abreu

Na terra do coração passei o dia pensando - coração meu, meu coração. Pensei e pensei tanto que deixou de significar uma forma, um órgão, uma coisa. Ficou só com-cor, ação - repetido, invertido - ação, cor - sem sentido - couro, ação e não. Quis vê-lo, escapava. Batia e rebatia, escondido no peito. Então fechei os olhos, viajei. E como quem gira um caleidoscópio, vi:
Meu coração é um sapo rajado, viscoso e cansado, à espera do beijo prometido capaz de transformá-lo em príncipe.

Meu coração é um álbum de retratos tão antigos que suas faces mal se adivinham. Roídas de traça, amareladas de tempo, faces desfeitas, imóveis, cristalizadas em poses rígidas para o fotógrafo invisível. Este apertava os olhos quando sorria. Aquela tinha um jeito peculiar de inclinar a cabeça. Eu viro as folhas, o pó resta nos dedos, o vento sopra.

Meu coração é um mendigo mais faminto da rua mais miserável.

Meu coração é um ideograma desenhado a tinta lavável em papel de seda onde caiu uma gota d’água. Olhado assim, de cima, pode ser Wu Wang, a Inocência. Mas tão manchado que talvez seja Ming I, o Obscurecimento da Luz. Ou qualquer um, ou qualquer outro: indecifrável.

Meu coração não tem forma, apenas som. Um noturno de Chopin (será o número 5?) em que Jim Morrison colocou uma letra falando em morte, desejo e desamparo, gravado por uma banda punk. Couro negro, prego e piano.

Meu coração é um bordel gótico em cujos quartos prostituem-se ninfetas decaídas, cafetões sensuais, deusas lésbicas, anões tarados, michês baratos, centauros gays e virgens loucas de todos os sexos.

Meu coração é um traço seco. Vertical, pós-moderno, coloridíssimo de neon, gravado em fundo preto. Puro artifício, definitivo.

Meu coração é um entardecer de verão, numa cidadezinha à beira-mar. A brisa sopra, saiu a primeira estrela. Há moças na janela, rapazes pela praça, tules violetas sobre os montes onde o sol se p6os. A lua cheia brotou do mar. Os apaixonados suspiram. E se apaixonam ainda mais.

Meu coração é um anjo de pedra de asa quebrada.

Meu coração é um bar de uma única mesa, debruçado sobre a qual um único bêbado bebe um único copo de bourbon, contemplado por um único garçom. Ao fundo, Tom Waits geme um único verso arranhado. Rouco, louco.

Meu coração é um sorvete colorido de todas as cores, é saboroso de todos os sabores. Quem dele provar, será feliz para sempre.

Meu coração é uma sala inglesa com paredes cobertas por papel de florzinhas miúdas. Lareira acesa, poltronas fundas, macias, quadros com gramados verdes e casas pacíficas cobertas de hera. Sobre a renda branca da toalha de mesa, o chá repousa em porcelana da China. No livro aberto ao lado, alguém sublinhou um verso de Sylvia Plath: "Im too pure for you or anyone". Não há ninguém nessa sala de janelas fechadas.

Meu coração é um filme noir projetado num cinema de quinta categoria. A platéia joga pipoca na tela e vaia a história cheia de clichês.

Meu coração é um deserto nuclear varrido por ventos radiativos.

Meu coração é um cálice de cristal puríssimo transbordante de licor de strega. Flambado, dourado. Pode-se ter visões, anunciações, pressentimentos, ver rostos e paisagens dançando nessa chama azul de ouro.

Meu coração é o laboratório de um cientista louco varrido, criando sem parar Frankensteins monstruosos que sempre acabam destruindo tudo.

Meu coração é uma planta carnívora morta de fome.

Meu coração é uma velha carpideira portuguesa, coberta de preto, cantando um fado lento e cheia de gemidos - ai de mim! ai, ai de mim!

Meu coração é um poço de mel, no centro de um jardim encantado, alimentando beija-flores que, depois de prová-lo, transformam-se magicamente em cavalos brancos alados que voam para longe, em direção à estrela Veja. Levam junto quem me ama, me levam junto também.

Faquir involuntário, cascata de champanha, púrpura rosa do Cairo, sapato de sola furada, verso de Mário Quintana, vitrina vazia, navalha afiada, figo maduro, papel crepom, cão uivando pra lua, ruína, simulacro, varinha de incenso. Acesa, aceso - vasto, vivo: meu coração teu.
Silêncio. As vozes estão todas caladas. Ninguém me conta uma história. Nada. Não se ouve nada.

Depois de tanto pedir, enfim, atenderam.

Arrependida, fico quieta, calada. Esperando qualquer sussurro.

Nada.

Elas não dizem nada. As vozes foram silenciadas.

Devo viver em paz, ele diz, tal qual os outros vivem.

Quem quer ser igual aos outros?, pergunto.

Onde estão as vozes?

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Zaz

Je Veux d'l'amour, d'la joie, de la bonne humeur
c' n'est pas votre argent qui f'ra mon bonheur,
moi j'veux crever la main sur le coeur

Em casa alheia...

Eles são muitos e estão em todos os lugares. Agitados, barulhentos, calmos, silenciosos. Chegam em horários diversos e revezam-se à mesa. A porta está sempre aberta.

Conversam de modo randômico, juntos ou de forma paralela. Os assuntos são os mais variados. De liquidação de sapatos à utilidade da Sequência de Fibonacci. Trocam roupas, presentes, farpas e afagos.

Foram separados, estão casados. São juntados, viúvos, apartamentados, abençoados por mãe de santo ou bispo evangélico. 

Têm filhos. Muitos filhos. E terão mais.

São simples e recebem bem. Comentam sobre a recente graduação em Oxford, férias nos Hamptons com o mesmo entusiasmo que cantam parabéns para a secretária e planejam o happy hour no churrasquinho da esquina.

Aqueles que estão distantes também participam. Na contramão da modernidade, eles se valem da tecnologia para manter os laços e conservar a tradição.

Eles são queridos, atenciosos e, além de tudo isso, cozinham bem. Reúnem-se às quartas-feiras, no horário do almoço, para um bate papo ameno. Foi o que li no convite.

Celebração da vida. Simpatia. Diversão. Foi o que presenciei.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Pérolas aos porcos

"Tem gente que é apenas um café na nossa vida, não queira transformá-los em um jantar".

Adoro ouvir conselhos, mas seguir...

Enfim, entre tropeços e recomeços vou trocando as refeições e fazendo confusões. Viajando sem rumo, gastando poesia, economizando alma. Resguardando o corpo, desgastando a mente, remendando o coração. Lendo Caio, ouvindo Rô Rô, comendo fritura, bebendo água tônica.

"O trabalho dignifica o homem". O que dizer, então, da procrastinação? "Correr atrás do prejuízo". Isso sim, conheço bem. Pressão e prazo andam junto com o arrependimento e não existiriam se eu soubesse dizer não.

Mas não é isso. Me enrolo. Me distancio. E começo frases com pronomes pessoais do caso oblíquo e conjunções adjetivas. E esqueço os porcos com suas pérolas. Por quê?

É tão óbvio que só de pensar em explicar, me canso.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Ainda me espanto com a vida e com as pessoas. Acho isso incrível. Não tenho a ilusão de já ter vivido tudo, mas somos bombardeados por emoções, sensações, fatos, de uma forma tão absurda e cruel, que o espanto virou luxo.

Banalização do todo? Do ser? Do eu?

Doeu. E dói. No começo dói. Mas passa. Calcifica. Vira rotina. Arroz-com-feijão.

Mas hoje não é dia de lamúrias ou autocomiseração. Hoje é o Dia Internacional da Fofice Alheia. Dia de perceber aqueles que são apenas gente-como-a-gente, mas fazem o seu melhor e nem sempre são notados, mas hoje... hoje sim.

Hoje é dia de se maravilhar com essa gente que dá bom dia sorrindo no elevador, que nem te conhece e põe a etiqueta da sua roupa no lugar, que te chama pra almoçar quando você não tem companhia, que te ouve, dá conselhos, carinho e ombro amigo sem ser seu chapa.

Hoje é dia de agradecer esses anjinhos vivos que perambulam por aí fazendo a nossa vida mais fácil!


sábado, 1 de junho de 2013

Notícias do lado de cá


Todos bem e com saudades. Eu, principalmente! Muita saudade não descreve a falta que você faz. Mas vamos deixar assim, pra manter minha fama de má.

Igor me acorda às 5h da manhã arranhando a porta, querendo brigar com o grande gato branco. Não deixo. Gato mimado, criado em apartamento, querendo brigar na rua? Entrou na adolescência, deve ser isso.

Cã não se importa com o hóspede. Tenta obter o máximo de carinho possível enquanto estou em casa. Isso e comida.

Gata finge que não existo e tenta restringir o território do novo hóspede felino. Ele não se dá conta disso. Dorme em cima da casinha da cã.

Rotina de caronas estabelecidas. Às segundas, quartas e sextas tenho conversa divertida garantida pela manhã. A matriarca cuida de mim à distância.

Por fim, a implicância que me é peculiar. A constatação geral é que a Zildinha é muito feia. Não disse nada, juro! Mas com o Igor ao lado dela fica difícil não perceber.

Mande notícias d'além-mar.

Gato na versão hóspede

é, definitivamente, terrorista.

Passeia pela casa alheia como se fosse dele. Perturba a cachorra-mais-educada-de-todos-os-tempos e, como se não bastasse, dorme em cima da casinha dela.

Usa os pertences da gata.

Destrói corações e rouba afagos. Suspiros acompanham frases de Ai, como é lindo! e Que dócil que ele é!, enquanto ele, maquiavélico, concentra todas as atenções em si. Bem gato mesmo.

Quando os olhares desviam-se, sobe nas bancadas, mesas, janelas, sofás, estantes e aparelhos de ginástica.

Provoca a gata.

Mia, faz charminho, se joga no chão ao menor barulho de humanos. Esses que ele engana com tanta facilidade.

E mia, mia, mia...
Agora com eco.