domingo, 16 de março de 2014

Espelho, espelho meu...

Repetiu o ritual de todas as manhãs. Levantou, olhou-se no espelho e constatou, mais uma vez, a ação dos anos. O tempo não era seu amigo, definitivamente.

Puxou o rosto com as mãos e imaginou como uma simples cirurgia poderia melhorar o seu humor matinal. Ficou alguns minutos em êxtase. Fantasiou festas, olhares apaixonados, elogios espontâneos. Tudo o que a juventude traz sem qualquer esforço.

Partiu, então, para o escrutínio do corpo. A barriga... Sempre a barriga! Quando aquele amontoado de gordura tinha surgido? Não sabia precisar. Porém, notava o crescimento dia após dia. Outra intervenção cirúrgica, pensou. Assim, ficaria bem humorada e feliz.

Esboçou, ainda, uma olhadela nas estrias e celulites, mas já estava irritada demais para perder tempo com isso. Entrou no banho jogando a toalha sobre o espelho para não acabar com o dia de vez.

Dia interminável no trabalho. Os problemas amontoando-se em pilhas somados a um chefe intragável faziam-na sentir-se completamente desgastada. Não só trabalho, uma lista enorme de afazeres também e nenhuma, nenhuma motivação.

Arrastou-se do escritório para a academia. Cumpriu a obrigação com má vontade desviando, como podia, seu olhar dos espelhos cruéis. Tomou banho e vestiu-se no reservado. Correu para a última tarefa da noite: terapia. Por que mesmo que precisava de terapia? Nem se lembrava. Recomendações médicas ou algo do gênero.

- Não, você ainda não pode ter alta.
- Por quê? Sinto-me tão bem e...
- Você tem 25 anos e não consegue se ver como é. Anorexia nervosa é uma doença séria e precisa de tratamento. 

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