domingo, 7 de agosto de 2011

Crônicas de Muito Amor

Apertando o peito,
sufocando o grito, 
contendo a lágrima.

I

Arrumei as roupas em duas malas. Não tinha muita coisa. Alguns sapatos, vestidos frescos e um casaquinho de lã. Tudo em tons pastéis. Sempre combinando.

Lembro-me bem do começo. Ela chegou e virou minha vida de pernas pro ar. Não queria saber se eu tinha compromisso, trabalho ou qualquer outra coisa que demandasse meu tempo. Exigia atenção. Mas fazia com tanta graça que eu nunca consegui brigar.

Lívia era assim. Determinada, mas doce. Exigente, ciumenta e carinhosa. Falava devagar, mas tinha a voz firme. Podíamos passar horas juntos sem nunca enjoarmos um do outro. Fecho os olhos e ainda sinto  sua pele macia, cheirosa. Os cabelos compridos, sempre trançados, refletiam o brilho do sol.

E tudo que me resta agora são lembranças e duas malas de roupas.

Não me preparei pra isso. Quando ficamos juntos, pensei que seria pra sempre. Apesar de reclamar das mudanças que uma pessoa a mais em casa provocam, não imaginei que terminaria um dia. Acho que me acostumei a tê-la sempre por perto.

Se eu chegasse carrancudo do trabalho, recebia-me com um sorriso. Sabia como mudar meu humor. Fazia gracejos. Jantávamos juntos e ela queria saber do meu dia. Não sossegava enquanto eu não contasse todos os detalhes.

Já havia decorado os nomes dos meus colegas e sabia com quais eu me dava e, também, os que eu não gostava. Só depois de ouvir tudo que eu tinha a dizer, falava-me do seu dia.

Duas malas de roupa, foi o que sobrou.

Às vezes, fazia perguntas descabidas.

- Você me ama?
- Claro que amo!
- Se eu morrer você fica triste?
- Que pergunta mais boba, Lívia!

Criança, às vezes, parece que pressente o que vai acontecer.

- Câncer, Sr. Paulo.
- Dá pra operar doutor?
- Não, nesse estágio não é possível fazer mais nada.

Chorei por três dias. Não sabia o que fazer. Ela pegou minha mão e disse:

- Não fica com medo, papai, eu vou continuar cuidando de você lá do céu.

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