terça-feira, 15 de novembro de 2011

Raridade

Vendia comida a granel. Tinha, também, giz que mata barata, presentes e doces em compota. Fazendas e aviamentos. Vendia-se de tudo naquela mercearia, inclusive, jarras-abacaxi.

Sustentava a mulher e três filhos. Construíra um sobrado logo atrás do comércio. O negócio só engorda com o olho do dono. Era o único que possuía televisão em sua rua. Os vizinhos reuniam-se em volta da modernidade à noite. A vendinha lhe dava boa condição de vida.

Os meninos estavam sempre às voltas com peraltagens. Coisa de criança, ele dizia, quando a mãe ralhava com os traquinas. Um dia, tentando fazer uma lamparina, o mais velho botou fogo na loja. Começou pelo estoque de jarras-abacaxi. O item que o menino mais admirava.

Não tinha seguro. Não era coisa que se fazia na época. Queimou tudo. O fogo se alastrou até a casa onde moravam. Passaram necessidade por muitos tempo até se restabelecerem de novo. O filho nunca disse nada. Nem ao pai, nem ao resto da família.

Muitos e muitos anos depois, em seu aniversário de 50 anos, ganhou uma jarra-abacaxi. Os pais, falecidos, não poderiam ver aquele regalo. Os olhos, com brilho de infância, encheram-se de lágrimas. Agradeceu.

A moça que o presenteara ficou sem entender. Ele, muito polido, tentou explicar.

- É raridade!
- Sim, encontrei-a em uma loja de antiguidades. Parece-me que acabaram na década de 70. Já não fabricavam mais e todo o estoque da loja onde eram vendidas pegou fogo.

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